Filtrando dados com inteligência de mercado

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Certa feita, precisava obter informações mais detalhadas sobre o mercado internacional de cimento e fiz uma pesquisa preliminar na Internet. Para minha surpresa, os únicos documentos que “prestavam” eram pagos e, diga-se de passagem, muito bem pagos (alguns custando até milhares de dólares)…

Tentei, então, contato com entidades setoriais e, mais uma vez, além de algumas poucas informações interessantes por telefone, nada além disso e, claro, mais uma proposta de serviço pago… Este um pouquinho mais barato do que as empresas internacionais provedoras de informação de mercado como a IHS Markit.

Pois bem. Apenas constatei, na prática, o velho de ditado de que informação é dinheiro… [rss]. Foi assim que finalmente descobri a importante diferença de fonte secundária versus fonte primária e o quão importante é saber navegar neste universo, em especial quando se trata de informações de mercado.

Portanto, caro leitor, não perca as informações que se seguem e aprenda definitivamente como se busca informações de mercado, altamente estratégicas e a custo ZERO!

Seleção das bases de dados de mercado

A Organização Mundial do Comércio (OMC) obriga que todos os países declarem suas informações de comércio exterior, respeitando as boas práticas de transparência internacional nos negócios. Tais informações são congregadas numa base de dados das Nações Unidas não tão conhecida, porém extremamente importante: a UN Comtrade.

Esta base de dados de mercado permite verificar os fluxos de importação e exportação de bens e serviços entre todos os países de maneira indiscriminada, propiciando a busca pelo código do Sistema Harmonizado internacional até 6 digitos (nomenclatura aduaneira padrão), o que já cobre uma infinidade de segmentos de mercado.

Ao se fazer uma consulta nesta base de dados, você terá uma dimensão do nível de informação que se pode extrair sobre o perfil de comércio de dado país, sua competitividade internacional em segmentos de mercado específicos, bem como interesses militares e tecnológicos estratégicos. Não é à toa que muitos países, sob regimes não-democrático, mantêm informações atrasadas e ou minimamente conflitantes…

O delay médio dos dados alimentados nesta base de dados chega a mais de 6 meses, o que acaba tornando sua aplicabilidade para precificação de commodities, por exemplo, extremamente desatualizada. Memso assim, sempre recomendo que qualquer pesquisa de mercado se inicie por ela!

Adicionalmente, muitos países dispõem das suas próprias bases de dados de mercado que são utilizadas para impulsionar as empresas nacionais que atuam fortemente no comércio externo: as tradings que já mencionamos anteriormente. O Brasil, por incrível que pareça, mantém uma das bases de dados mais sofisticadas que tive acesso até hoje. Um exemplo a ser seguido em outros órgãos do governo federal, além do MDIC! Abaixo apresento uma lista com as principais bases de mercado que monitoro assiduamente.

Figura. Lista de bases de dados de mercado.

Identificando produtos

Como realizar o tal do data mining para gerar os documentos de inteligência de mercado? Comecemos identificando os produtos. Imagine uma empresa que já atua há muito temo no mercado de nutrição animal, no entanto viu suas margens espremidas nos últimos anos com uma forte mudança da estrutura do mercado de rações pet, resultando em capacidade ociosa de fábrica e custos crescentes para industrialização.

Qualquer consultor de negócios apresentaria a solução óbvia: diversificação para mercados adjacentes que estejam em alta, tais como o dos fertilizantes líquidos para fertirrigação. Mas por onde começar o levantamento de mercado e mensurar o tal do TAM, SAM e SOM? Quais são os produtos mais comercializados no Brasil e no mundo?? Seus volumes de vendas e preços??? Se somos tomadores ou formadores de preços…

Comecemos nossa busca pela UN Comtrade digitando o código HS do segmento de mercado (ex. 31, fertilizers) e avaliando as sugestões automáticas da base de dados até o nível de 6 digitos. Neste caso, você encontrará algo como duas dúzias de nichos de mercado dentro do segmento de Fertilizantes. Detalhe: se pesquisar numa base de dados de mercado nacional terá a chance de descer no nível dos produtos em si digitando o NCM de 8 digitos e obtendo dezenas de resultados… Faça um teste agora mesmo na Comex Stat!

Identificando tradings

Conhecer os países TOP 10 do mercado internacional ou até mesmo abrir os estados com maior participação de alguns destes países até que não é uma tarefa tão difícil… Em alguns cliques bem direcionados você chegará facilmente nas respostas. Agora, conhecer as empresas atuando diretamente no mercado ou as tradings propriamente ditas, aí sim é que são elas!

Apararentemente trata-se de missão impossível por conta dos critérios de sigilo fiscal que nos limitam ao NCM de 6 digitos. No entanto, cruzando com outras ferramentas acessíveis gratuitamente e conciliando com um conhecimento um pouco mais profundo do mercado de químicos, por exemplo, é possível identificar as empresas no mapa, seu porte, outros produtos do seu portfólio e até mesmo os dados de contato!

Para o mesmo exemplo do segmento de fertilizantes, selecionamos o produto uréia que tem o NCM 310210. Encontramos então, somente no estado do Rio Grande do Sul, 8 empresas, sendo duas delas de grande porte com mais de 50 milhões de USD$ em importações anuais: a Roullier Brasil Ltda. e a Sinon do Brasil Ltda. No caso da Sinon, conseguimos identificar todos os 8 produtos importados pela empresa.

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Ainda não entramos nem no detalhe, mas imagino que muitos já vislumbraram a riqueza de informações que podem nos ajudar na tomada de decisão e estratégia competitiva das empresas com atuação no mercado internacional e também nacional, mesmo porque praticamente todos os preços de insumos são referenciados globalmente.

A inteligência de mercado sempre se preza aos dois lados: o da compra e o da venda!

Caso ainda não tenha caído a ficha: pergunte a um químico experiente se é possível, com os dados do mercado de uréia que extraímos em poucos minutos, ter uma radiografia detalhada da sua atuação de um dos maiores players e sua estratégia produtiva?!

Veja só, isto que vimos vale para qualquer mercado… É só apresentar o dado para um especialista na área e verás! Vamos mergulhar nisso e tudo ficará mais claro.

Créditos:

Autoria por Ricardo Barreto

Da obra no prelo VALOR: desvendando conceitos e quebrando mitos

VOLUME I – INTELIGÊNCIA DE VALOR: algoritmos para boas decisões

Sobre a inteligência de mercado

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Para encerrar a nossa série de capítulos voltados para inovar, não poderíamos deixar de falar da “inteligência de mercado”. E digo mais: não fosse ela, de nada valeria fazer pesquisas sofisticadas, nem tampouco empregar tecnologias de ponta na indústria. Mandatório mesmo é que todo novo produto (ou serviço) tenha o tal do fit de mercado!

Quantos não são os projetos de inovação que acabam morrendo no momento decisivo do lançamento?! Aprendi a duras penas essa lição ao passar anos a fio desenvolvendo um material nanotecnológico para descolorir efluentes industriais e logo nos primeiros testes industriais nos deparamos com um “produto substituto” imbatível!!

Sem sombra de dúvidas, um olhar atento nas bases de dados de mercado nacionais e internacionais poderia ter mudado o rumo dessa história… Anyway, caro leitor, mergulhe comigo neste universo da “inteligência de mercado” e não se arrependerá.

O trader

Não serei mais um a falar sobre a onda avassaladora de pequenos especuladores que operam ativos de curto prazo nas bolsas de valores ao redor do mundo numa ciranda incessante de ganhos financeiros crescentes… Nosso foco aqui são os traders que atuam profissionalmente nas empresas de trading, comprando e vendendo “produtos reais” no mercado internacional. Estes sim são os verdadeiros traders

Além de um profundo conhecimento das normas de comércio exterior, tais profissionais primam pela capacidade de negociação aguçada, bem como o uso de informações privilegiadas de transações comerciais que podem representar ganhos de até milhões de dólares quando colocadas na mesa no momento certo e com as pessoas certas…  

Tive oportunidade de trabalhar numa grande empresa brasileira de commodities minerais e presenciei a notoriedade de um squad de inteligência de mercado. Juro pra vocês: eram apenas três traders da mais alta competência que monitoravam o mercado internacional, falavam com insiders e geravam relatórios estratégicos diuturnamente… Não é à toa que os diretores executivos não saíam do pé da mesa deles!!

A trading

Na última relação divulgada pelo Sicomex em 2021, o Brasil apresentava 164 trading companies habilitadas. São empresas comerciais peculiares que atuam como intermediárias entre empresas fabricantes e empresas compradoras, em operações de exportação ou importação. Parece bastante, mas ainda se trata de um número pífio mediante o número de tradings em países desenvolvidos como nos USA que chega na casa dos milhares…

Fato é que o número de tradings com atuação num país é importante métrica para ajudar a dimensionar o esforço de mercado em termos de comércio exterior. Somente para se ter uma ideia, segundo a UN Comtrade database, o Brasil exportou em 2019 não mais do que USD 225 bilhões em produtos diversos enquanto os USA chegaram bem próximo de USD 1,65 trilhão!

Quem já colocou a mão na massa sabe o parto que é realizar um processo desses! Nem um profissional experiente, com boa visão de regulamentação e incentivos fiscais consegue fazer tudo sozinho… Conta sempre com o apoio dos despachantes aduaneiros. Se até para grandes empresas a coisa não é fácil, imagine para as pequenas e médias!? É aí que entra o papel das tradings, promovendo o acesso irrestrito ao mercado internacional.

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Mas o que complica tanto as transações comerciais entre países? Não deveriam os governantes buscarem acordos de cooperação comercial que trouxessem facililidades para suas empresas??? Afinal de contas, é o saldo na balança comercial que aprecia o câmbio, enriquecendo ou empobrecendo a população no final do dia, certo?!

O problema é o tal do protecionismo. Ao imporem medidas para proteger o mercado interno de alguns produtos específicos dos concorrentes internacionais, certos países acham que estão estimulando a economia local quando, na verdade, estão é criando as bases para o isolamento de uma gama muito maior de produtos e empresas…

Veja o caso das relações comerciais entre Argentina e Brasil. Segundo o GTA (Global Trade Alert), desde 2008 o Brasil teve 162 intervenções “liberalizantes” e 285 “danosas” nas transações com a Argentina. O principal setor afetado foi o de cereais, mais especificamente o milho com 32 intervenções. Ou seja, não é só no futebol que los amigos Hermanos nos rivalizam!!  

Figura. Mapa de intervenções comerciais entre Brasil e Argentina.

Será mesmo que esta uma estratégia sustentável? Países vizinhos que poderiam estar explorando muito melhor sua proximidade logística, explorando suas “fortalezas e fraqueza”, mas que ficam disputando sansões ao invés de cooperar. Que vergonha!

Pelo menos não somos só nós que não nos entendemos. Acabamos de assistir a uma verdadeira “guerra comercial” entre os USA e China, deflagrando o fracasso da política comercial do governo Trump que comprovou que o isolacionismo não combina com o capitalismo liberalista.

Entretanto, Trump estava certo pelo menos num ponto: a Organização Mundial do Comércio (OMC) não deveria fazer vista grossa aos impropérios que a China está cometendo no tocante ao respeito à propriedade intelectual. Os países devem competir sim, mas respeitando os tratados internacionais, seja qual for o quesito!     

Créditos:

Autoria por Ricardo Barreto

Da obra no prelo VALOR: desvendando conceitos e quebrando mitos

VOLUME II – INTELIGÊNCIA DE VALOR: algoritmos para boas decisões