CONHECIMENTO versus IGNORÂNCIA § 46 – 48

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§ 46

Diálogo com Chicão (parte II). E naquele sebo, digno do Chicão, antes de frustrar quaisquer expetativas literárias, me  disse ele mais ou menos assim:

_ Espere um minuto, meu caro. Não é comum, nos dias de hoje, aparecer por aqui um jovem interessado nestas coisas…

Saiu do recinto por um instante e voltou com um punhado de livros empoeirados, dentre os quais fui surpreendido por preciosidades como uma coleção de Júlio Verne do século XIX e um tratado de medicina alternativa publicado no Uruguai muito tempo atrás… Puxa, mas que maravilha viajar no tempo assim, pela literatura e a saga pelo conhecimento! Meu orçamento não estava à altura do verdadeiro valor daquelas obras, mas o Chicão viu o brilho dos meus olhos e propôs uma “marota” e gostosa brincadeira:

 _ Você levará estes e todos aqueles outros ali se acertar ao menos uma das perguntas que lhe farei… [hehe]

Claro que ele começou com a mais fácil. Veja só:

_ Qual foi o primeiro livro publicado em solo brasileiro?

Não preciso dizer que passei bem longe da resposta certa… [*] Então, fui bombardeado por uma série de perguntas, uma mais difícil e ao mesmo tempo interessante que a outra. Acho que valeria uma “tese acadêmica” a busca pelas respostas detalhadas para cada uma delas… Eu, pasmo, percebi o tamanho da minha “ignorância” diante daquele homem tão maravilhoso de se ouvir, tamanha sabedoria! Conversamos um bom bocado (na verdade minha vontade era passar o resto do dia ali, mas a esta altura minha mulher e filhinha, sentadas na frente daquela casa antiga, já me olhavam com uma cara pra lá de azeda). Moral da história: levei comigo muitos livros preciosos por uma bagatela e digo a vocês, foi uma das experiências mais indescritíveis sobre o tema: um douto d´alma, um “espírito livre”, digno de estar num pedestal junto de Bertrand Russel ou, por que não, de um Nietsche… Sim, fiquei apaixonado por aquele homem, pelo Chicão. O resto, por Deus, está cravado em minha memória!

Figura. Marília de Dirceu: primeiro livro editado no Brasil.

§ 47

Ninguém sabe o que julga. Poderíamos inferir, por conseguinte, que a ignorância é resultante apenas da falta de conhecimento, certo? Nenhuma conclusão diferente desta seria mais apropriada! O ignorante é aquele que, por algum motivo ignóbil, priva-se de descobrir e acumular novos conhecimentos. Assume, por assim dizer, certas “verdades” e não aceita nada que as contraponha. Ou seja, como diria Sócrates: é aquele que “sabe o que julga, mas ignora o que não sabe”. São, portanto, dogmáticos puros. Talvez seja este o pior tipo de “cegueira”, aquela em que se vive num mundo cerceado por crenças infundadas. Pense em alguém que não escuta e fala desenfreadamente. Não aceita ideias alheias de sorte alguma. Seus pensamentos são literalmente “blindados” à construção do saber. Isto quer dizer que não há renovação das crenças: o aspecto que melhor caracteriza uma consciência virtuose!

§ 48

Cientologia ou dataísmo? Cite um exemplo prático de como a ignorância pode atrapalhar a evolução consciencial. Normalmente estas pessoas “ignorantes” vão se isolando, limitando-se ao convívio com um grupo restrito de consciências que tenham crenças minimamente semelhantes às suas… Veja o caso dos “cientologistas”. Muitos dissidentes desta seita, travestida de apelos de ficção muito além das telinhas (o ator Tom Cruise é o mais conhecido fiel), relatam que perderam o contato até mesmo com os familiares mais íntimos. Este tipo de credo normalmente acompanha rígidas práticas aos adeptos à medida que avançam no processo que denominam de “auditoria”, sem falar das perdas financeiras impostas para mudarem de estágio de desenvolvimento. A “igreja da cientologia” é propalada como religião em muitos países desenvolvidos,[**] mas os exemplos de extremismos “exóticos” estão se tornando muito frequentes entre as camadas mais instruídas da população mundial, desde o clássico embate dos criacionistas versus evolucionistas, até a mais recente onda que chega com a promessa de poder mudar a nossa visão de mundo: o dataísmo.1 


[*] O Brasil começou a editar livros em 1808 com a fundação da Imprensa Régia por D. João VI. A primeira obra a ser impressa foi Marília de Dirceu, de Tomás Antônio Gonzaga. Nesta época, era o imperador quem decidia que livros seriam ou não publicados… A impressão fora das oficinas reais era proibida! Por isso, só era divulgado o que não “ofendia” o Estado, a religião e os costumes da época.

[**] A Cientologia é um conjunto de crenças e práticas criada por L. Ron Hubbard (1911–1986), começando em 1952, como sucessor ao seu sistema de autoajuda chamado Dianéticas. Hubbard caracterizou a Cientologia como religião e em 1953 incorporou a Igreja da Cientologia em Camden, Nova Jersey.

Créditos:

Autoria por Ricardo Barreto

Da obra no prelo CULTURA DE VALOR: aforismos para uma vida plena

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Saiba mais:

1Harari, Yuval Noah, HOMO DEUS: uma breve história do amanhã, 1a ed., São Paulo: Companhia das Letras, 2016.

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